SOCIAL, CULTURA e EDUCAÇÃO

Relatório revela sucateamento da Educação de Jovens e Adultos no Brasil

O Ensino de Educação de Jovens e Adultos (EJA) vem sendo sucateada ao longo da última década. A queda drástica de investimentos no período tem causado reflexo direto no número de matrículas e de escolas públicas que ofertam essa modalidade de ensino. Além disso, desde 2012 o governo federal descumpre a Constituição ao esvaziar o programa nacional de livros didáticos para a alfabetização desses brasileiros.

Essas são algumas conclusões do relatório “Em busca de saídas para a crise das políticas públicas de EJA”, coordenado pelo Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec) em parceria com a Ação Educativa e o Instituto Paulo Freire. O trabalho foi encomendado pelo Movimento Pela Base, rede não governamental e apartidária que monitora a implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e do Novo Ensino Médio.

O levantamento utiliza dados atualizados de órgãos oficiais, como o Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (Siop), o Ministério da Educação (MEC) e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) para fazer um raio-X do problema e propor soluções.

Os dados apontam forte queda de investimentos na área: os recursos federais destinados à EJAs no Brasil caíram de quase R$ 1,5 bilhão em 2012 para R$ 38,9 milhões em 2022. O valor atual equivale a cerca de 3% do montante de dez anos atrás. “Além da redução do investimento, ocorreu uma mudança importante no destino dos recursos”, afirma Alice Ribeiro, diretora de articulação do Movimento Pela Base. “Deixou-se de investir no ProJovem (focado em estudantes entre 18 e 29 anos), no Programa Brasil Alfabetizado (para combater o analfabetismo de adultos) e quase nada foi destinado à EJA escolar”, complementa.

Em compensação, o governo passou, a partir de 2018, a investir no Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja). “Em 2018, foram R$ 117,6 milhões para o Encceja e apenas R$ 24,6 milhões para o EJA. Tal quadro mostra que o governo federal apostou muito mais na via da oferta dos exames como política pública para a EJA do que na indução da ampliação da oferta pelos estados e municípios, causando o encolhimento do número de matrículas”, afirmou Alice Ribeiro

De acordo com o relatório, as matrículas de jovens e adultos passaram de 4,08 milhões em 2011 para 2,9 milhões em 2021, uma redução de 27%. No estado de Rondônia, por exemplo, a queda de matrículas chegou a 73%. O número de escolas públicas que ofertam a EJA caiu 29%, de 38.769 unidades em 2010 para 27.472 em 2021. Já o número de escolas privadas teve leve variação positiva no mesmo período: de 1.673 para 1.770.

Material didático

O documento destaca ainda o processo de esvaziamento do Programa Nacional do Livro Didático para a Alfabetização de Jovens e Adultos (PNLA-EJA), criado por meio da Resolução nº. 18/2007, que foi ampliado e incorporado ao Programa Nacional do Livro Didático para a Educação de Jovens e Adultos (PNLD-EJA). “Deveríamos ter editais para compra de livros do PNLD-EJA em 2011, 2014, 2017, 2020 e 2023. Entretanto, o último edital foi divulgado em 2013, para utilização em 2014 com as reposições nos anos de 2015 e 2016. Não houve depois de 2017 novas reposições de livros com base no PNLD EJA 2014. E em 2022 deveria ter sido lançado novo edital de convocação das editoras, o que ainda não ocorreu”, lamenta Alice.

Com a defasagem do PNLD-EJA, uma das conclusões do levantamento é que o MEC e o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) “vêm descumprindo inequivocamente” a Constituição Federal, a LDB e o PNLD-EJA, entre outras normas.

Soluções

O documento pede o fim do desmonte das políticas públicas de EJA, com a retomada do papel ativo do governo federal e efetivo financiamento da modalidade, por meio de fundos de educação, além da revisão de suas diretrizes nacionais curriculares. Para o PNLD-EJA, o levantamento mostra a necessidade da elaboração de um novo edital, com critérios e diretrizes específicos para a modalidade, em diálogo com as diferentes formas de organização da EJA no país (incluindo as escolas do campo, as que atendem a populações indígenas, quilombolas e ribeirinhas, bem como pessoas com deficiência, privadas de liberdade, imigrantes e refugiados). “Tal documento precisa considerar a BNCC como uma de suas referências, porém, deve estar aberto a outros parâmetros que respondam às especificidades de seus sujeitos e de seus modos de organização”, diz Alice.

Sobre o Movimento Pela Base

O Movimento Pela Base é uma rede não governamental e apartidária de pessoas e instituições que desde 2013 se dedica a apoiar a construção e implementação de qualidade da BNCC e do Novo Ensino Médio. Sua missão é trabalhar em parceria para garantir os direitos de aprendizagem e desenvolvimento de todas as crianças e jovens brasileiros.

Alice Ribeiro, diretora de articulação do
Movimento Pela Base.

FOTOS: Divulgação