NOTA DE REPÚDIO E ESCLARECIMENTO SOBRE COLUNA PUBLICADA NO JORNAL MOMENTO
O CPERGS Osório recebeu nesta semana texto escrito no site do Jornal Momento de Osório, assinado por Omar Luz, sob o título “Volta às aulas? Para quê?. O conteúdo do artigo é extremamente raso e com demonstração clara de enviesamento político-ideológico por parte de seu autor.
Nós, como categoria de profissionais de educação, preparados para uma das tarefas mais duras da sociedade, que é receber crianças e adolescentes, e também adultos, acolhê-los e prepara-los para o mundo: para o mundo do trabalho e para o mundo das relações pessoais, nos sentimos profundamente entristecidos com o teor do artigo, pois traz ofensas gratuitas à toda a categoria.
O texto já repercutiu muito nesses dias e foram inúmeras manifestações de indignação e repúdio na comunidade, o que mostra o tamanho do equívoco do senhor Omar ao produzir tal peça textual. A comunidade reconhece o trabalho de seus professores e isso já seria suficiente para que nos sentíssemos contempladas em termos de resposta. Mas não podemos os furtarão que fazemos de melhor: educar. Por isso decidimos emitir esta nota, que repudia as ofensas e as inverdades proferidas, mas também esclarece, visando trazer luz para onde não há.
O autor começa o texto falando sobrea grande quantidade de analfabetos e analfabetos funcionais, além de citar os analfabetos da geração Paulo Freire”, seja o que quer que ele queria dizer com isso. Para auxiliar a compreensão da real situação, esclarecemos que a taxa de analfabetismo entre adultos reduziu drasticamente nas últimas décadas. Na década de 60, período do governo militar, por exemplo, a taxa de analfabetos com 15 anos ou mais era de quase 39,6%, em2010 esse valor já havia caído para apenas 9,6%. Paulo Freire, ciado na matéria, é o mais prestigiado pesquisador brasileiro em todo o mundo, tendo seu principal trabalho, o livro “Pedagogia do Oprimido”, como o terceiro mais citado em trabalhos acadêmicos no mundo, na área de ciências sociais e o único brasileiro entre os 100 autores mais citados.
O autor ainda pede que Estados, União e municípios obriguem a retomada das atividades escolares. Essa é uma das partes desconexas com a realidade e a mais fácil de ser verificada. Bastaria ter entrado com contato comas escolas ou até mesmo com alguém dos Estados, União ou municípios para saber a situação das aulas em 2020, que ocorreram sim, apesar das dificuldades impostas por pandemia que foge ao controle de qualquer professor, jornalista ou outro profissional de qualquer área. Superadas as dificuldades, as aulas ocorreram e os alunos forma acompanhados, sim. Mas nem mesmo o mais alienado dos seres sociais poderia esperar que o rendimento geral dos estudantes fosse o mesmo de outros tempos em um ano com tantas perdas de amigos e familiares, professores e até mesmo de colegas.
No decorrer do texto o autor demonstra que, na verdade, tudo o que escreveu é um desabafo, um ato pessoal de protesto contra uma professora que manifestou algo em rede social que ele não gostou. Imprudente ele coloca toda u8ma categoria de baixo de ofensas, julgamentos infundados e promove uma grande confusão sobre a realidade escolar.
Como há forte insistência do autor sobre a necessidade, em seu ponto de vista, de voltar às aulas presenciais, precisamos também esclarecer algumas questões sobre a pandemias, para que não reste nenhuma sobre a importância de termos mantido as escolas sem abrir para aulas presenciais durante a pandemia.
Nesta terça-feira, dia 02/02/2021, o Brasil bateu o recorde de óbitos desta pandemia, atingindo a marca de1.726 em apenas 24 horas. Mas a calamidade de saúde pública está à porta desde que a pandemia chegou ao Brasil. No ano de 2020 foram mais de 7,5 milhões de pessoas infectadas e quase 200 mil mortes causadas pela Covid-19. Isso sem ainda mencionar as inúmeras curadas, mas que amargam graves sequelas decorrentes da doença. No ano de 2021 já foram quase 3 milhões de pessoas infectadas, ou seja, em apenas 2 meses já temos quase a metade de novos casos do que ocorreram no ano anterior. E ainda estamos contabilizando mais de 60 mil mortes, só neste ano, ou seja, após apenas 17% dos dias deste ano já atingimos 30% das mortes no ano passado1.
Em 23 de outubro de 2020 o comitê técnico d apoio à Associação dos Municípios do Litoral Norte (AMLINORTE) formado por servidores docentes e técnicos da UFRGS em conjunto com servidoras da 18ª Coordenadoria Regional de Saúde, atuante na região do Litoral Norte, elaboraram o Parecer com posicionamento sobre volta às aulas presenciais no litoral em que recomendavam que as aulas permanecessem de forma remota2. O parecer indicava o agravamento da situação, sendo que no mês de outubro de 2020 o Litoral Norte computou 2521 casos e 31 óbitos e no mês seguinte foram 5226 casos e 72 óbitos. No mês de fevereiro deste ano foram 6620 e 77 óbitos3. É inquestionável que a situação hoje é ainda pior do que quando o comitê alertou sobreo risco da retomada das atividades presenciais nas escolas. Também é alarmante a situação atual da ocupação de leitos hospitalares clínicos e de UTI na região e no Estado como um todo.
O Centro de Operações de Emergências da 18ª CRS/RS recomendou nos últimos dois dias que sejam adotadas as medidas de lockdown, pois o sistema de saúde já colapsou. Mas ainda assim estamos aqui discutindo retomada de aulas presenciais. A saber, a ocupação de leitos de UTI está em 100% no Litoral Norte, já a ocupação de leitos clínicos é de 127%, mesmo com a abertura de 5 novos leitos no Hospital Santa Luzia, em Capão da Canoa, sendo que recentemente os hospitais da região tiveram grande acréscimo de leitos para atenderem melhor as demandas de Covid.
Para além disso, o número de casos de surtos em escolas desde que as atividades foram retomadas (precipitadamente) em 2021 é assustador e ainda que seja quase impossível ter ciência de todos os casos, há matérias suficientes para esclarecimentos em sites de notícias em todo o Brasil.
Considerando as principais medidas de proteção contra o contágio de coronavírus que são o uso de máscara, distanciamento, higienização das mãos e tempo reduzido em local fechado, salienta-se que a atividade docente consiste em falar. Alie-se o simples falar ao falara usando máscara de forma a ser ouvido e compreendido pelos alunos em sala de aula e tem-se um docente falando alto e consequentemente espalhando mais partículas de saliva, que podem estar contaminadas no caso do docente ser um assintomático ou estar nas primeiras horas de apresentação de sintomas4.
Segundo estudo apontado na revista Exame, em setembro 2020, o risco de contágio em um ambiente fechado com alguém gritando ou cantando (como é o caso dos docentes), mesmo que utilizando máscara e com pouca aglomeração, varia de entre médio e alto, conforme a ventilação do local. Se a ventilação for ruim ou a aglomeração for maior, o risco é alto5.
Há ainda que considerar a intensa aglomeração de pais e alunos nos horários de entrada e saída, onde não é possível controlar e garantir que o distanciamento de 2 metros seja mantido, nem como impedir que os alunos interajam entre si sem supervisão nos momentos anteriores e posteriores às aulas. Há ainda o risco evidente quando os alunos precisam retirar a máscara, por qualquer motivo particular ou para fazerem o lanche no horário estabelecido, o que gera uma momentânea redução no nível de segurança dos alunos.
Salienta-se que a única forma de retomar as atividades em segurança é através da vacina. E o aumento descontrolado do contágio pode gerar novas variantes, como ocorreu em Manaus, que venham a ser resistentes às vacinas já desenvolvidas, tornando todo o trabalho até aqui completamente inútil.
Em resumo, permitir situações que promovam picos ou surtos da doença, antes que haja um método preventivo eficaz, é contribuir para que ela venha a se alastrar mais, contaminar e matar mais e ainda tornar inúteis todas as ações de pesquisa e desenvolvimento de vacinas. Ou agimos com paciência, respeitando os limites científicos, ou poderemos pagar com nossas vidas. Por isso defendemos a frase “escolas fechadas, vidas preservadas”, pois toda a comunidade escolar sabe que os que estão fechados são apenas os prédios, pois a escola mesmo continua funcionando e cumprindo seu papel de ensinar não só o português e a matemática, mas o papel cidadão e a vida em sociedade. Os conteúdos curriculares foram ensinados, mas talvez a maior lição em 2020 tenha sido a solidariedade e o senso de cuidado e proteção.
Marli Aparecida de Souza – Diretora
Direção do 13º núcleo do Cpergs Osório